segunda-feira, 9 de maio de 2011

IMAGENS, DESENHOS E SIGNIFICADOS DE PROFESSORES E ALUNOS COMNECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS EM ESCOLAS COM EDUCAÇÃOINCLUSIVA

1Contribuições do desenho em Educação Inclusiva2Fernanda Maria Trentini Carneiro3; Neli Klix Freitas4

Palavras-Chave: Educação Inclusiva, Ensino de Artes Visuais, Desenho

Resumo - O presente artigo compreende a Educação Inclusiva focalizada na arte, educação einteração social apoiada nas contribuições de Vygotsky e seus seguidores. Assinalabrevemente medidas legislativas existentes, aponta a aprendizagem relacionada aodesenvolvimento da criança, a contribuição da arte na educação e o desenho, elemento deestudo desta pesquisa, por onde é possível visualizar e acompanhar o processo deinternalização. E, a importância da educação inclusiva no ensino, aprendizagem edesenvolvimento infantil.A inclusão de alunos com necessidades educativas especiais às escolas está garantidaem diversas medidas legislativas. Tais medidas, como a Constituição Federal (1988),Declaração de Salamanca (1994), Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDBN(Lei nº 9394/96), entre outras, estabelecem o direito à educação em rede regular de ensino àspessoas com necessidades educativas especiais.As mesmas proclamam que, além de todas as crianças terem o direito à educação comuma aprendizagem adequada, aquelas crianças com necessidades educativas especiais devemter acesso à escola regular, ou seja, todas devem aprender juntas, independentemente dedificuldades e diferenças que possam existir. Assim é possível a construção de uma sociedadeacolhedora e solidária.Mesmo que a legislação tenha assegurado uma conquista para a vida social daspessoas com necessidades educativas especiais, a questão é mais abrangente.


1 Projeto de Pesquisa CEART/UDESC2 Artigo elaborado a partir do projeto de pesquisa citado acima.3 Discente do Curso de Licenciatura em Artes Plásticas – CEART/UDESC, bolsista de iniciação científica doPROBIC/CNPq.4 Orientadora, Docente do Departamento de Artes Plásticas – Centro de Artes – Av Madre Benvenuta, 1907,Itacorubi, Florianópolis/SC.dificuldades dessa demanda, garantindo uma educação de qualidade.

O importante é que se busque na escola a proposta de integração dos estudantes, paraque a participação possibilite uma melhoria em sua aprendizagem e a valorização desse serhumano como ser social.

Alunos com necessidades educativas especiais apresentam dificuldades deaprendizagem que “refere-se não a um único distúrbio, mas a uma ampla gama de problemasque podem afetar qualquer área do desempenho acadêmico”. As necessidades educativas quemais tendem a causar problemas acadêmicos são “aquelas que afetam a percepção visual, oprocessamento da linguagem, as habilidades motoras finas e a capacidade para focalizar aatenção” (SMITH; STRICK, 2001, p.15).Mesmo diante da possibilidade desses educandos freqüentarem a escola regular, énecessário que o professor estruture uma metodologia para que atenda as dificuldades deaprendizagem de todos os alunos.A aprendizagem tem por objetivo “estabelecer um processo de inferências etransferências entre os conhecimentos que se possuem e os novos problemas-situações que seapresentam aos indivíduos” (HERNANDEZ, 2000, p.119). Ela também pode ser consideradacomo “(...) o aspecto necessário e universal, uma espécie de garantia do desenvolvimento dascaracterísticas psicológicas especificamente humanas e culturalmente organizadas” (REGO,2002, p. 71).

O aprendizado está diretamente relacionado com o desenvolvimento da criança.Através dele a criança desperta, ao longo de seu desenvolvimento, vários processos internosque se estruturam em representações mentais mediante a interação com seu meio. Nasrelações existentes entre desenvolvimento e aprendizagem ativa-se a zona dedesenvolvimento proximal, que é a “distancia entre o nível de desenvolvimento real, que secostuma determinar através da solução independente de problema”, ou seja, o qual a criançajá é capaz de resolver sozinha e o “nível de desenvolvimento potencial, determinado atravésda solução de problemas sob orientação de um adulto ou em colaboração com companheirosmais capazes” (VYGOTSKY, 1998, p.112).No ensino regular, destacamos o ensino de Artes Visuais que proporciona a todos osalunos uma relação com as linguagens visuais, suas produções e o contexto em que estãoinseridas. A arte, hoje, permite a utilização de inúmeros materiais, expressões artísticas e as“novas técnicas são utilizadas lado a lado com as técnicas tradicionais como possibilidadescriativas” (STUMM, 2004, p.360).

Além disso, a arte faz referência às imagens do contexto social, como “umaconstrução social mutante no espaço, no tempo e na cultura, que hoje se reflete nasinstituições, nos meios de comunicação, nos objetos artísticos, nos artistas e nos diferentestipos de público” (HERNANDEZ, 2000, p.52).É dessa relação das artes visuais com o contexto social, que é possível afirmar que aarte contribui como mediadora entre o sujeito e o mundo. Com base em Stumm (2004, p.362),que cita Vygotsky: “(...) via a arte como um processo de comunicação social, envolvendosentidos e significados inteligíveis a qualquer pessoa, combinando as vivências individuaiscom a recepção do produto estético, percebido como produto social da cultura”.A arte instiga a criatividade e a imaginação, contribuindo para o desenvolvimento eaprendizagem. E, um dos objetos de estudo neste projeto foi o desenho, sendo que nosateremos a ele como linguagem e elemento de mediação em Educação Inclusiva.Selecionamos o desenho, pois nele é percebida a relação da criança com o meio, o que auxiliana construção e no domínio das funções sociais e psicológicas. Na perspectiva de Pillar(1996, p.36):

O olhar de cada um está impregnado com experiências anteriores, associações,lembranças, fantasias, interpretações, etc. O que se vê não é o dado real, mas aquiloque se consegue captar e interpretar acerca do visto, o que nos é significativo.Do ponto de vista de Cox (2003, p.89), estudar o desenho é pensar “(...) que ascrianças se dedicam mais frequentemente ao desenho do que a qualquer outra atividadepictórica. (...) podem facilmente desenhar sem a ajuda dos adultos”. Outra questão seria que“a capacidade de desenhar bem é manifestamente a base para todas as artes pictóricas”.Alguns pesquisadores apontam diferenças nos desenhos de crianças “regulares” e criançascom necessidades educativas especiais. Segundo Cox, estes pesquisadores “enfatizam ainsuficiência de detalhes, a falta de organização, proporções imperfeitas e a inclusão dedetalhes estranhos ou irrelevantes encontrados nos desenhos” por parte das crianças comnecessidades educativas especiais. Ainda aponta que crianças com necessidades especiais,estão “simplesmente passando pelos estágios de desenho num ritmo mais lento do que acriança regular”.Revendo questões históricas pode-se encontrar referências ao emprego do desenhopara diagnosticar as capacidades e estado mental das crianças, como a maturidade intelectual,as dificuldades de aprendizagem, personalidade, ajuste emocional, entre outros (COX, 2003).O histórico permite relacionar também, as teorias psicológicas que fundamentam aspráticas pedagógicas e que influenciam nos processos de ensino. A pesquisadora Ferreira(2001), em seu livro Ensino das Artes – Construindo Caminhos, destaca três linhas teóricas.A abordagem Inatista, que “enfatiza a herança genética (...), o desenho é considerado umaatividade natural da criança e pouco se pode fazer para desenvolvê-lo (...)” Aqui podemosdestacar a pesquisa de Luquet que enfatiza as etapas de grafismo realizado pelas crianças deacordo com faixas etárias.Outra abordagem refere-se aos ambientalistas, que “destacam o meio ambiente comoo principal responsável pelos processos de desenvolvimento e aprendizagem”. Nestaabordagem a intervenção do professor, ao extremo impede a criança de encontrar seu espaçode criação. O grande defensor dessa teoria é Skinner. Os ambientalistas são identificados comos Behavioristas, os quais se preocuparam “em explicar os comportamentos observáveis dosujeito, desprezando a análise de outros aspectos da conduta humana como o seu raciocínio,os seus desejos e fantasias. (...) uma visão do indivíduo enquanto ser extremamente reativo àação do meio” (DAVIS; OLIVEIRA, 1994, p.31).
Diante dessas duas abordagens, a interacionista “propõe um diálogo entre aquilo que acriança traz ao nascer e as condições materiais concretas de existência que encontra”. Destaabordagem destacamos o papel da cultura e da sociedade no desenvolvimento e naaprendizagem das crianças. Vygotsky é um dos expoentes do sócio-interacionismo. Dentre assuas principais idéias está a relação indivíduo e sociedade, ou seja, a interação social. Rego,estudiosa de Vygotsky referiu que “ao mesmo tempo em que o ser humano transforma o seumeio para atender suas necessidades básicas, transforma-se a sim mesmo” (REGO, 2001,p.41). Por essa interação social, dessa inter-relação de fatores internos e externos originam-seas funções psicológicas como a imaginação, percepção, atenção, sensação, memória,representações mentais, pensamento e linguagem.Esta pesquisa de natureza qualitativa, bibliográfica e de caráter exploratório contemplaa abordagem do desenho como elemento mediador. Conforme afirmação anterior, o desenhoé particularmente importante em Educação Inclusiva. Por isso, a base teórica de nosso estudoestá apoiada principalmente nas contribuições de Vygotsky, para quem o desenho é umaforma de linguagem (VYGOTSKY, 2003). São incluídas contribuições de seguidores deVygotsky. Assim, o “desenho é uma linguagem que surge tendo por base a linguagem verbal”(VYGOTSKY 1991 apud FERREIRA, 1998, p.70).
Através dos desenhos é possível acompanhar o processo de internalização deelementos visuais, o que juntamente com a fala, oferece uma compreensão melhor noentendimento de sua elaboração. O mesmo “lida com os elementos do tempo e do espaço. Oato de desenhar congrega o presente com um passado e um futuro. Imagens nascem daobservação, da memória, da imaginação”. (DERDYK, 2003, p. 118)Vygotsky (2003) formulou princípios teóricos importantes sobre imaginação e fantasiaque utiliza como sinônimo. Sua obra “La imaginación e la arte en la infancia” (2003),contempla estas questões e apresenta sua teoria sobre o desenho infantil.Para Vygotsky, a imaginação ou fantasía, seria “(...) la actividad del hombre seredujera a repetir el pasado, (...) es precisamente la actividad creadora del hombre la que hacede un ser proyectado hacia el futuro, un ser que contribuye a crear y que modifica supresente”. Resalta ainda que esta “(…) como base de toda actividad creadora, se manifiestapor igual en todos los aspectos de la vida cultural posibilitando la creación artística, científicay técnica.”(VYGOTSKY, 2003, p. 09).A imaginação atribuída ao desenho, na verdade, relaciona-se com recriações deelementos visuais que a criança já conhece e sentimentos do mundo real de que se apropria,internalizando-as em seu repertório psicológico, expressando em seu desenho o seu estilo. E,“as figuras vão sendo incorporadas de acordo com os interesses e as demandas da imaginação.Independente de sua forma concreta” (FERREIRA, 1998, p.89).A internalização de imagens ao repertório psicológico se dá graças à interação social eexperiências vividas. Por essa razão, o adulto possui um repertório mais amplo que umacriança. Porém, a criança é bem mais espontânea em seus gestos e na fala do que os adultos.De acordo com Vygotsky (2003, p.17):La actividad creadora de la imaginación se encuentra en relación directa conla riqueza y la variedad de la experiencia acumulada por el hombre, porqueesta experiencia es el material con el que erije sus edificios la fantasia.Cuanto más rica sea la experiencia humana, tanto mayor será el material delque dispone esa imaginación. Por eso, la imaginación del niño es más pobreque la del adulto, por ser menos su experiencia.Na educação inclusiva, em arte e educação, o papel do professor é o de mediador,fundamental na relação entre a criança, seu desenho e sua realidade. Ele “precisa estar (...)familiarizado com a história da arte e com a arte contemporânea, (...) propiciando condiçõespara que os educandos possam entender as relações que a arte estabelece entre seu contexto”(NARDIN e FERRARO apud FERREIRA, 2001, p. 184). A arte permite através da vivênciano mundo e das múltiplas linguagens visuais a apreensão desse contato para seu repertórioimagético.Na avaliação de desenhos, é preciso que o professor estabeleça critérios transparentespara as crianças, já que sua relação diante delas sugere afetividade e afirmações em suasações. Segundo Ferreira e Silva (apud FERREIRA, 2001, p. 147):Os conceitos bom, muito bom, melhor, ótimo, péssimo, errado, certo, feio, bonito ouainda 'A tia está triste com você', que deixam a criança completamente desinformadasobre os critérios que conduziram tais julgamentos e sem saber como proceder naspróximas atividades artísticas.Dessa maneira, é preciso “que os docentes (...) estejam atentos a como os alunos (...)levam adiante compreensões sobre o significado de determinadas obras e representaçõesculturais” (FERREIRA, 2001).É necessário também que o professor conheça os princípios teóricos que fundamentamsua análise do desenho. No caso desta pesquisa, o desenho é tratado em consonância com ospressupostos de Vygotsky. Para Vygotsky (2003), a criança desenha o que conhece. Nestaperspectiva a interação social adquire um papel de primeira grandeza. Como mediador, oprofessor deve possibilitar o contato com o meio, com a cultura, com os signos e símbolos.Considerando a Educação Inclusiva em sala de aula, os educandos com necessidadeseducativas especiais, por meio da integração sócio-cultural com as crianças sem necessidadeseducativas especiais, podem trocar experiências, o que propicia a construção de relaçõessociais com o meio, a compreensão das diferenças, de como lidar com diversas situações,ampliando seu repertório visual, no qual se insere o desenho.
Nessa perspectiva, a arte é um fator importante em Educação Inclusiva, poispossibilita que a criança, além do reproduzir como comunicador social, desenvolva a intuição,a percepção, as habilidades motoras, sendo fundamental no processo de aprendizagem,desenvolvimento e expressão individual.Referências:COX, Maureen. Desenho da criança. São Paulo: Martins Fontes, 1995.DAVIS, Cláudia; OLIVEIRA, Zilma de. Psicologia da educação. São Paulo: Cortez, 1994.DERDYK, Edith. Formas de pensar o desenho – desenvolvimento do grafismo infantil.São Paulo: Scipione, 2003.FERREIRA, Sueli; SILVA, Silvia Maria Cintra da. “Faz o chão pra ela não ficar voando”-o desenho na sala de aula. In: FERREIRA, Sueli (org). O Ensino das Artes – construindocaminhos. São Paulo: Papirus, 2001.FERREIRA, Sueli. Imaginação e Linguagem no Desenho da Criança. São Paulo: Papirus,1998.HERNANDEZ, Fernando. Cultura Visual, Mudança Educativa e Projeto de Trabalho.Porto Alegre: Artes Médicas, 2000.NARDIN, Heliana Ometto; FERRARO, Mara Rosângela. Artes Visuais nacontemporaneidade: marcando presença na escola. In: FERREIRA, Sueli (org). O ensinodas artes – construindo caminhos. São Paulo: Papirus, 2001.PILLAR, Analice Dutra. Desenho e construção de conhecimento na criança. Porto Alegre:Artes Médicas, 1996.REGO, Teresa Cristina. Vygotsky: uma perspectiva histórico-cultural da educação. 13.ed.Petrópolis: Vozes, 2002.SMITH, Corine; STRICK, Lisa. Dificuldades de aprendizagem de A a Z. Porto Alegre:Artmed Editora, 2001.STUMM, Rebeca Lenize. O contexto sociocultural na frmação do artista plástico: umestudo em atelier de cerâmica. In: CORRÊA, Ayrton Dutra. Ensino de Artes: múltiplosolhares. Ijuí: Unijuí, 2004.VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processospsicológicos superiores. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.VYGOTSKY, L. S. La imaginación e la arte en la infancia. Espanha: Akal, 2003.DECLARAÇÃO DE SALAMANCA. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf, acesso em junho de 2008.SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. Disponível em http://portal.mec.gov.br/seesp/, acesso em junho de 2008.

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